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Geoff Colvin, autor do livro Desafiando Talentos (Foto: Joseph Moran)
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Geoff Colvin, 55, autor do best seller americano Desafiando Talentos - Mitos e verdades sobre o sucesso (Editora Globo, páginas 228, R$ 32,80 ), defende a ideia de que talento não é um dom, mas resultado de persistência e longo treinamento. Editor da revista Fortune, Colvin veio ao Brasil recentemente para divulgar seu livro. Em entrevista à Pequenas Empresas & Grandes Negócios, ele aconselhou empreendedores a investir mais na capacitação dos funcionários, pois em tempos de crise, um desempenho brilhante é questão de sobrevivência.
O que o motivou a escrever o livro?
A existência ou não de talentos naturais é um assunto de meu interesse. Durante anos, sempre pensei a respeito disso, mas eram apenas pensamentos. Até que decidi escrever um artigo sobre o tema para a revista Fortune e descobri que existia uma série de pesquisas científicas dedicadas ao assunto. Então, publiquei o artigo e, para minha surpresa, recebi uma quantidade imensa de cartas e e-mails elogiando o tópico. Naquele momento, me dei conta que valia a pena detalhar o assunto em um livro, não só por ter material suficiente, mas por saber que podia ajudar muitas pessoas a se tornarem melhores.
Por que é tão importante saber como formar um talento?
É importante porque, geralmente, a vida das pessoas é dirigida por suas convicções. Se, por exemplo, você acredita que só pode ser bem-sucedido quem já nasce com o dom para realizar determinada tarefa, certamente você nunca tentará algo inusitado e nem irá superar seus limites. O que é extremamente desanimador. Por isso, é fundamental que o indivíduo saiba que, com foco e muita prática, é possível desenvolver potencialidades jamais imaginadas. Talentos são, na maioria dos casos, formados por aquilo que os pesquisadores denominam como prática deliberativa. Uma prática exaustiva em busca do aperfeiçoamento.
Em Desafiando o Talento, o sr. cita os exemplos de Mozart e do golfista Tiger Woods para mostrar que, na verdade, pessoas que identificamos como talentosas e que nasceram com um talento natural para brilhar são fruto de um treinamento duro praticado desde cedo. Dom não existe?
Alguns pesquisadores acreditam que não, mas prefiro não ser tão radical. Para mim, se talento nato existe, ele é muito menos importante para o sucesso do que a maioria de nós imagina. Tiger Woods começou a praticar golfe com apenas dois anos de idade. Seu pai era apaixonado pelo esporte e fez o possível e o impossível para tornar o filho um vencedor. Com Mozart aconteceu algo semelhante. Ele também teve forte influência paterna. Leopold Mozart era músico e criou um programa de treinamento intensivo para o filho quando ele tinha apenas três anos de idade. Vale ressaltar que não conheço nenhum caso de alguém que se tornou muito bom em determinada atividade antes de, no mínimo, dez anos de prática deliberada. Mozart e Tiger Woods começaram cedo e atingiram o ápice cedo, o que aos olhos de muitos os torna mais geniais ainda.
É possível descobrir uma aptidão tardiamente e se destacar?
Claro que sim, principalmente em atividades que não estão relacionadas com esportes e música. No mundo dos negócios, as pessoas só começam a colocar a mão na massa depois que saem da faculdade. Antes disso, é importante ampliar o leque de conhecimento, estudar línguas e ler bastante. A partir de então, dá para começar a trabalhar em algo depois de concluída a universidade e se destacar no caminho que quiser seguir. E não é possível apenas no meio empresarial. Em outras áreas como, por exemplo, medicina e jornalismo, é comum os talentos só se consolidarem depois dos 30 anos.
Por que apenas algumas pessoas desenvolvem o desejo de ser “a melhor”, enquanto outras se contentam com uma carreira mediana?
Eu acredito que pessoas que se destacam possuem uma motivação interna que não as deixa desistir. O desejo de ser o melhor, a maioria dos indivíduos possui, mas eles desistem quando surgem os primeiros obstáculos e percebem que terão que abrir mão de uma série de outras atividades e momentos de lazer. Não é fácil se dedicar a algo que consome horas e horas de trabalho pesado e que o resultado só será visto algum tempo depois. Praticar não é prazeroso.
Como os princípios contidos no seu livro podem ser aplicados na rotina das empresas para que elas melhorem seus resultados?
As companhias podem aplicá-los de duas maneiras. Primeiro, é preciso detectar em que setor o funcionário pode desenvolver melhor suas potencialidades. A partir de então, é preciso ter mentores mais experientes capazes de dar um direcionamento. O outro caminho é ensinar os princípios da prática deliberativa aos empregados e deixar que eles se desenvolvam por conta própria. Nem todos irão seguir as instruções, mas algumas pessoas certamente vão ter interesse e são que elas fazem a diferença. Outra vantagem é que o programa também pode ser incorporado por empresas menores, onde o número de funcionários é reduzido e é possível acompanhar o desenvolvimento de cada um mais de perto.
O sr. pode dar um exemplo de alguma empresa que utiliza a prática deliberativa para aumentar os lucros?
Prefiro não citar nomes, mas outro dia estava conversando com o presidente de uma empresa do setor de equipamentos médicos e ele me disse que resolveu testar a prática deliberativa nos funcionários de venda. Antes do treinamento, o índice de sucesso nas vendas girava em torno de 25%. Depois, passou a ser de 95%. Foi um salto expressivo que gerou um lucro extra de US$ 1 milhão. Grandes empresas, como Procter & Gamble e GE, também já entenderam que um desempenho brilhante é, de fato, desenvolvido e que vale a pena investir na capacitação das pessoas.
Com a crise, as empresas têm enxugado o quadro de empregados e estão cortando funções. Diante do cenário atual, existe uma pressão maior para que a perfeição seja atingida?
Sem dúvida alguma. Não há como manter empregados que não mostram resultados e que não pensam em aperfeiçoar habilidades em busca do sucesso coletivo. Em tempos de crise econômica, desempenho excelente é questão de sobrevivência, pois o concorrente pode vir de todos os lados.
Atualmente, observa-se o surgimento de muitas crianças prodígio. É saudável direcioná-las para um desenvolvimento precoce?
Esta é uma questão delicada e polêmica. Os pais devem montar a carga horária dos seus filhos ou é melhor esperar que eles atinjam a maioridade para que decidam por si próprios? Ainda não temos uma resposta, mas acredito que a prática de esporte, o aprendizado de línguas ou de instrumentos musicais devem ser iniciados na infância. Outras atividades podem ser acrescentadas se os pais perceberem que os filhos estão felizes e gostam do que fazem. É preciso também tomar cuidado para não sobrecarregar os pequenos, o que mais tarde pode resultar em muita rebeldia.
Que conselhos daria para aqueles que querem ser um talento?
Primeiramente, seja honesto com você mesmo. Avalie se tal objetivo corresponderá a sua expectativa pessoal. Se a resposta for afirmativa, o primeiro passo é descobrir em que nível de conhecimento você se encontra, quais são seus pontos fracos e o que precisa fazer para superá-los. Em seguida, pode ser interessante buscar ajuda de alguém mais experiente e fazer uma espécie de diário com metas a serem seguidas. Tenha sempre em quem se espelhar e não desista diante das dificuldades. O mundo empresarial precisa de pessoas com tais qualidades e quem as desenvolve sai certamente na frente.
Os conceitos expostos no livro são aplicados no seu dia a dia?
Tento aplicá-los. Sou jornalista, há muitos anos escrevo e procuro analisar meu trabalho com rigor. Por ter uma posição de destaque são poucas as chances de eu ser criticado. Por isso, constantemente realizo uma auto-avaliação e busco me aprimorar. Acredito que, se todos os meus colegas de profissão fizessem o mesmo, teríamos, inegavelmente, uma mídia de melhor qualidade.
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